Se o direito é tão presente em nossas vidas e, aparentemente, todos nós já possuímos algum grau de conhecimento teórico sobre o assunto, por que sentimos uma certa insegurança ao responder perguntas como "o que é o direito?" ou "qual é a diferença entre lei e direito?" Essas questões, simples à primeira vista, revelam uma complexidade subjacente que vai além do conhecimento superficial. Muitos de nós estamos familiarizados com normas jurídicas, ouvimos falar de leis, tribunais e advogados, mas, na hora de articular uma definição mais profunda ou de compreender as nuances entre conceitos como "lei" e "direito", encontramos dificuldades.
Essa insegurança não é uma falha de conhecimento básico. Na verdade, ela decorre da própria natureza multifacetada e ambígua do fenômeno jurídico. O direito não é apenas um conjunto de regras escritas, mas uma estrutura social, uma prática, um discurso e, sobretudo, um campo de disputa e interpretação. Assim, as respostas para essas perguntas iniciais são mais complexas do que parece, exigindo um mergulho nas camadas teóricas que sustentam o sistema jurídico.
O Problema Não É a Falta de Conhecimento Básico
Ao longo de anos de experiência como professor, percebi que a dificuldade dos alunos em responder questões básicas sobre o direito não decorre da falta de conhecimento. A maioria dos estudantes de direito chega à universidade já carregando uma bagagem significativa de noções jurídicas, adquiridas pela experiência cotidiana, pelo consumo de notícias ou pela educação básica. Eles sabem o que são leis, têm uma noção do que significa "justiça" e compreendem, ao menos em parte, o papel do sistema jurídico na organização social.
No entanto, esse conhecimento inicial, que pode parecer suficiente para o senso comum, revela-se superficial e, muitas vezes, enganoso. É como uma visão de superfície que oculta a profundidade e a complexidade do fenômeno jurídico. Ao longo do nosso curso, vamos perceber como as concepções básicas que a maioria das pessoas tem sobre o direito não são suficientes para entender suas complexidades. Mais do que isso, vamos descobrir que essas noções podem, de fato, atrapalhar o desenvolvimento de um conhecimento jurídico mais crítico e profundo.
A Distância Entre a Crença e a Realidade
Depois de dez anos lecionando para turmas de graduação em direito, cheguei à conclusão de que a situação é ainda mais preocupante do que eu inicialmente imaginava. Aquilo que os alunos acreditam saber sobre o direito antes de ingressarem no curso não apenas não corresponde à realidade do fenômeno jurídico contemporâneo, mas também impede uma compreensão mais profunda e impede o desenvolvimento de uma prática jurídica bem-sucedida.
Já testemunhei muitos alunos que iniciam a graduação com grandes expectativas, motivados por uma visão idealizada do que é estudar e praticar o direito. Eles chegam cheios de energia, prontos para desvendar o funcionamento das leis e ansiosos para exercer um papel relevante na sociedade. No entanto, cinco anos depois, muitos desses mesmos estudantes concluem o curso exaustos e, muitas vezes, frustrados. Eles se deparam com incertezas não só sobre sua formação, mas também sobre seu futuro profissional. Esse fenômeno não é isolado, e levanta uma questão importante: por que a formação em direito parece gerar mais dúvidas do que respostas?
Parte da resposta está na discrepância entre o que os estudantes esperam do curso e a realidade do fenômeno jurídico. A visão que muitos trazem é permeada por clichês e ideias simplistas sobre o funcionamento do direito — ideias que são rapidamente confrontadas pela complexidade do estudo acadêmico e pela prática jurídica real. Essa dissonância pode ser desorientadora, e é por isso que muitos estudantes se encontram em um estado de incerteza ao final de sua formação.
Questionar Para Compreender
Para superar essas limitações e frustrações, é necessário confrontar as concepções mais comuns sobre o direito. O curso de Teoria do Direito tem como objetivo não apenas ensinar o conteúdo jurídico, mas também instigar os alunos a questionar aquilo que acham que sabem. O objetivo é colocar as concepções populares à prova, testá-las à luz de uma análise crítica e aprofundada. Isso exige uma desconstrução das certezas iniciais e um comprometimento com o processo de reflexão.
Entretanto, preciso fazer um alerta: entender profundamente o fenômeno jurídico não é uma tarefa fácil. Esse é um processo que exige desconforto e, em alguns momentos, até um certo grau de sofrimento intelectual. Muitos evitam o estudo teórico do direito exatamente porque temem esse tipo de confronto, preferindo permanecer na superfície, onde as respostas parecem mais simples e confortáveis. Mas, para quem deseja compreender o direito de verdade, o caminho exige perseverança e abertura ao questionamento.
É importante ressaltar que você não estará sozinho nessa jornada. Meu papel como professor é facilitar essa transição, ajudando a guiar vocês através das complexidades teóricas e práticas que encontrarão ao longo do curso. Nosso objetivo é construir juntos uma compreensão sólida e crítica do direito, que vá além dos clichês e das noções superficiais que permeiam o imaginário social.
Comentários